O dia vinte e quatro de abril tem um especial significado, na medida em que foi no vigésimo quarto dia

que se iniciaram as movimentações que permitiram o sucesso da alvorada seguinte, aquela em que ocorreu uma mudança política, que soma já o seu 43º aniversário e que determinou o fim da censura e dos limites impostos às liberdades individuais, nomeadamente à liberdade de expressão.
Porém, neste contexto de liberdade, se confundirmos essa mesma liberdade de expressão com liberdade de agressão, estaremos novamente a enveredar por uma linha de violação dos direitos individuais, cuja defesa, de uma forma tão afirmativa, mobilizou a sociedade portuguesa em 1974.
Quando isso acontece em ambientes do tipo “purificados”, a exemplo daquilo que ocorre em alguns órgãos de comunicação social da Guarda, um pouco à laia de ideologias que outrora giraram em torno da ideia de que só uma espécie predestinada é que podia ter direito à luz do dia, podemos dizer, como muitas vezes ouvimos afirmar, que necessitamos um novo vinte e cinco de abril.
Mas, se entendermos que necessitamos um novo vinte e cinco de abril, estaremos apenas a defender aquilo que a própria Constituição da República, Lei fundamental do nosso Estado, acautela, no seu Artigo 37º, no Ponto 1, de que “Todos têm o direito de exprimir e divulgar o seu pensamento pela palavra, pela imagem ou por qualquer outro meio, bem como o direito de informar, de se informar e de ser informados, sem impedimento nem discriminações.”.
Contudo, num ambiente de liberdade, a expressão de palavras e pensamentos, com ausência de contraditório, é, claramente, um “impedimento e uma discriminação”, no que ao exercício do mesmo direito por terceiros diz respeito, e é igualmente violadora do direito que deve assistir a qualquer cidadão português de defender a sua honra.
A liberdade de expressão é um dos alicerces mais sólidos do nosso regime democrático, pelo que toda e qualquer iniciativa que a pretender pôr em causa, seja qual for a natureza do fórum onde isso ocorra, corre o risco de entrar em colisão com natureza da própria democracia que tanto valorizamos e pode significar ainda um atropelo às liberdades, aos direitos e garantias que tanto defendemos, sem nunca esquecer os deveres que lhe estão subjacentes, numa perspetiva de desenvolvimento da relação equilibrada da nossa vivência em sociedade.
Mudando um pouco de assunto e para que a ordem das ideias inscritas no título se mantenha intocável, passaria apenas a explicar aquilo que todos sabem, de que a prática do contorcionismo físico é um número tipicamente desempenhado em circos, inserido num espetáculo reconhecido e admirado no mundo desde a antiguidade.
A contorção é uma arte circense cujo objetivo é evidenciar capacidades físicas do corpo e que se situam ao nível da flexibilidade, que pode ser atributo de homens ou mulheres.
Normalmente, quando esta flexibilidade é descoberta em tenras idades, as pessoas que possuem esta caraterística física podem ter um grande futuro e o contorcionismo assumir-se como uma forma de garantir um retorno financeiro considerável, que pode significar um sustento de vida.
O domínio do corpo, nesta difícil disciplina, exige também um grande domínio da mente, para que a ordem das posições assumidas ocorra com a elegância e a harmonia que prenda a atenção do público, para que o espetáculo possa ser um sucesso.
Porém, noutras circunstâncias em que situação que se inverte e se passa de contorcionismo corporal para contorcionismo mental, este já não exige tanto do corpo, para além da perda de verticalidade, e surge em idades mais maduras, em que já nem seria possível, com facilidade, desenvolver a total flexão das articulações tão necessária à contorção corporal.
Mas nada disso seria problemático, porque ao nível do contorcionismo mental, o das ideias ou da falta delas, qualquer idade é uma boa idade, uma vez que a própria existência de coluna vertebral deixa de ser condição necessária à prática desta modalidade.
Esta outra forma de contorcionismo, que até pode envolver exercícios em disciplinas bem mais exigentes de praticar, como sejam os mergulhos em poço olímpico, com mortais encorpados à retaguarda, seguidos de piruetas duplas e triplas, que temos visto nos últimos tempos em espaços e ambientes que julgaríamos improváveis, e onde alguns comentadores praticantes dizem, desdizem, contradizem, metem os pés pelas mãos e as mãos pelos pés, num alucinante exercício de enrola a língua e cabeça perdida, fazendo lembrar os maridos infiéis a tentar explicar um passado injustificável, num presente em que nem conseguem ser coerentes. Estes são os que hoje se colocam em fila com o poder, na ambição de atingirem estrelatos para os quais poderiam nunca ter sido talhados.
Estes comentadores chegam ao ponto de se sujeitarem a assumir o conhecidíssimo papel do “cão de fila”. E não me estou a referir aquela “fila” nem à circunstância de que fala Voltaire, quando diz que “há quem brilhe na segunda fila e se eclipse na primeira”, estarei mais na linha de pensar que uma inteligência vulgar é como um mau cão que ao caçar, tão depressa encontra a pista de um pensamento, como rapidamente a volta a perder. Aquele que, ao servir alguém de forma tão servil, é capaz de chegar a morder ao próprio dono.
Ora, quando se assume o papel de “cão de fila”, serve-se a quem paga e fica-se simultaneamente impedido de se mover por convicções, deixando a dignidade atrás de uma côdea de pão. E se chegarmos a falar de dimensão humana, “os cães de fila” nunca serão recordados por serem retos, leais ou competentes. Serão recordados por morderem muita gente, com a consciência da vileza que estavam a cometer nesse preciso momento!