Olhos nos olhos


No momento em que escrevo este texto, os meios de comunicação informam que, neste ano, em Portugal e até à data, há a registar trinta e duas vítimas mortais de violência doméstica ou, por outras palavras, os homens já mataram, no presente ano, trinta e duas mulheres. Mesmo que fosse apenas uma, a situação já seria preocupante. Trinta e duas é simplesmente aterrador.
A comunicação não especifica se todos estes homens estavam, de facto, casados com as mulheres que mataram, ficando apenas a saber-se que, em muitos destes casos, as vítimas tinham posto fim à relação, o que não era aceite pelos homicidas. E fica também a saber-se que, vasculhadas as casas do agressor e das vítimas, são, por vezes, encontrados autênticos arsenais enquanto noutros casos, a arma do crime é uma faca de cozinha.
De todo o noticiário medonho, a única consequência positiva tem sido colocar em estado de alerta as autoridades policiais, que passaram a responder com maior prontidão em casos de queixas por violência doméstica.
Se pretendermos responder como se prevenirão, no futuro, situações deste tipo, as respostas são sempre difíceis, uma vez que cada situação é diferente das outras. Contudo, sempre se poderá dizer o seguinte: a luta contra a violência doméstica deveria começar em casa, ser continuada e exercitada na escola, coadjuvada pela comunicação social, mormente pelas televisões, que, se quiserem, podem ter um altíssimo papel formativo. Contudo, enquanto a concorrência entre os diversos canais televisivos, assentar nas audiências, que visam apenas lucros pela publicidade vendida, não receberemos daí o contributo positivo possível.
Sempre que acontece uma desgraça destas, ficamos também a saber que os familiares das vítimas estão a receber apoio psicológico. É bom que o Estado garanta apoio psicológico às vítimas. Mas seria óptimo colocar psicólogos em programas preventivos de formação familiar. Para conceder uma licença de uso e porte de arma, o Estado exige, e bem, uma série de documentos para aferir da perigosidade do portador. Para se poder casar, as exigências são poucas. Para aqueles que optam pelo casamento religioso, a Igreja determina a obrigatoriedade dum “curso” de preparação para o matrimónio. Faz bem. Não ficaria mal ao Estado entregar aos candidatos ao casamento civil um pequeno texto explicitando os direitos e deveres inerentes ao casamento civil. E em todas as escolas, a partir do Ensino Básico, deveria estar gravado na parede o Artigo 24.º da Constituição da República: «A vida humana é inviolável.»

Observação: o título do texto reporta-se ao personagem principal de um conhecido conto do escritor francês Charles Perrault publicado em 1698. Nele, o Barba Azul matava todas as mulheres que não conseguiam resistir à curiosidade e, contra a sua proibição expressa, abriam a porta de uma dependência do castelo.