Entrevista: Rui Campos, fotógrafo


Rui Campos é natural de Seixas, Vila Nova de Foz Côa. É neto e sobrinho de fotógrafos. Estudou no Instituto Politécnico da Guarda, no curso de Comunicação Multimédia.Nos tempos livres gosta de desfrutar da maravilhosa aventura da vida.
A GUARDA: Quem é Rui Campos o fotógrafo da bicicleta?
Rui Campos: O Rui Campos é fotógrafo. Neto e sobrinho de fotógrafos. Penso que o fotógrafo Rui Campos pode muito bem ser uma espécie de mimetização do avô paterno, pese embora com percursos distintos. Tive o primeiro contacto com a fotografia quando tinha 12 ou 13 anos, depois de ter pedido ao meu pai que me deixasse aprender relojoaria (outra paixão) com o meu avô. O meu pai não deixou, dada a idade avançada que ele já tinha. Com o acesso vedado aos relógios, que eram caros, comecei a mexer nas câmaras fotográficas, que no fundo também são relógios.
A GUARDA: É verdade que anda regularmente pela cidade da Guarda e leva sempre imagens impressas consigo?
Rui Campos: É verdade, sim. A ideia do Imagens da Lusitânia começou com o desconfinamento da COVID19 e é a minha resposta à diminuição de trabalho à qual eu também não fui imune. Mas não ando só pela Guarda. Nesta fase inicial, vou também para Trancoso às sextas-feiras. Mas a ideia é criar um circuito na região, aproveitar o imenso material fotográfico que acumulei ao longo de quase três décadas e rentabilizá-lo. Uma vez que me desloco, a ideia é preencher as falhas e criar assim um acervo de imagens da Beira Interior. É uma espécie de desmembramento de um outro projecto chamado CyPho, que criei em 2015. Mas agora, e porque considero que a região tem um potencial imenso, procuro realizar algum dinheiro a vender fotografias minhas a quem possa encontrar interesse nelas. 
A GUARDA: Porque é que afirma que a sua principal preocupação não é capturar imagens ou cenas?
Rui Campos: Aquilo que me preocupa é de alguma forma materializar por via da imagem a minha forma de interpretar esta aventura que é a vida humana. Muitos fotógrafos aprendem técnicas e adquirem equipamento específico para as aplicarem uma e outra vez, na mesma fotografia, variando apenas o lugar em que ela é feita. Eu tenho para mim que dessa forma tudo o que eu estaria a fazer seria procurar conseguir uma visão do Mundo, mas através de uma janela. Penso que há muito mais para ver e não é possível consegui-lo assim. Penso também que há muito mais para registar fotograficamente do que cenas. Existe toda uma linguagem que pode ser explorada por via da imagem, camadas de significado, semiótica, etc. Penso que uma cena, digamos, tradicional apenas pode ser contemplada, não conta uma história, não convida ao imaginário, não desafia o intelecto. Eu não tenho nenhum interesse em explicar como e onde fiz uma fotografia, interessa-me contar o que vi e porque é que a fotografei assim. E isto não são cenas, são histórias, vivências… é participar na aventura da vida. Uma mensagem pode ser lida, interpretada de infinitas formas, pode estabelecer compromissos, despertar consciências, sentar pessoas à mesma mesa e motivar dialéticas além da matéria fotográfica per se. A fotografia é demasiado emocionante e abrangente para que eu me fique por repetições técnicas de cenários diferentes. A GUARDA: Quais os principais projectos em que está envolvido?Rui Campos: Imensos! Perdi-lhes a conta. Escrevo tudo em cadernos para não me esquecer e revisito-os regularmente. Há lá centenas, talvez milhares de projectos escritos à espera do seu momento. Sei que é impossível desenvolver todos, por muitos anos que viva. Desenvolvo sempre múltiplos projectos em simultâneo, porque quando ando na rua, seja em trabalho, seja em ócio, encontro sempre formas de complementar os projectos que tenho em curso. Nem vale a pena enumerá-los. A última vez que procurei fazer isso, contei mais de trinta. Mas sei sempre para qual quero aquela imagem, quando a encontro. Mas tenho de abrandar… é demais, é avassalador. (risos). Precisava de mais tempo.
A GUARDA: Quais os lugares que o fotógrafo já percorreu com a bicicleta e a câmara?
Rui Campos: O Projecto CyPho já me levou a fazer a Costa Vicentina e Alentejana, até Troia, depois Évora, Monsaraz, São Pedro do Corval, Mourão, Viseu, Ecopista do Dão, Ecopista do Sabor, Coimbra, Figueira da Foz, Pinhão, Régua… Este Outono espero poder ir para o Minho pedalar e fotografar, sem referir o Distrito da Guarda. Fazer férias de bicicleta permite-me andar suficientemente depressa para percorrer 80 a 100 kms por dia e suficientemente devagar para conseguir absorver e registar a essência dos lugares que visito, sempre em Portugal. A ideia prestar atenção a tudo o que existe entre a partida e o destino, entrar verdadeiramente em Portugal, em vez de “andar pela rama”.
A GUARDA: O que é a Academia de Fotografia e a quem se destina?
Rui Campos: A academia de fotografia é uma espécie de “arrumar a despensa” há muitos anos que vem gente ter comigo a perguntar coisas acerca de fotografia. A determinada altura dei por mim a estar sempre a falar de fotografia e decidi separar as águas a bem da minha sanidade mental. A Academia foi a minha forma de preparar e estruturar mais de vinte cursos e workshops acerca de áreas, temas e assuntos distintos e poder partilhar com os interessados a minha forma de estar na fotografia, enquanto posso estar na rua e não ter de estar sempre a falar em fotografia. 
A GUARDA: E o Projecto Referentes que nasceu, em 2005, em Foz Côa?
Rui Campos: O Referentes é literalmente o projecto da minha vida. É um projecto idealizado e iniciado na certeza da continuidade. Quando eu desaparecer alguém com outra visão distinta há-de pegar-lhe e redireccioná-lo para onde achar pertinente. Assenta no espólio fotográfico que o meu avô paterno acumulou ao entre a década de 30 e 80 do século passado. O conceito é “retirar o pó” do acervo, partilhá-lo com a comunidade, conferir-lhe uma utilidade e esperar que essa utilidade garanta a sua conservação enquanto ele está acessível, em vez de encerrado nalgum lugar húmido e escuro para prazer de uma ou duas pessoas.