Entrevista: Manuel Peres Sanches - autor do livro «1908-1910 “Frades Jesuítas”
Correm Portugal Pela Muita Tinta dos Jornais»


Manuel Peres Sanches nasceu em Aldeia da Ponte, concelho do Sabugal. Psicólogo, clínico, psicoterapeuta. Ganhou interesse pela “História”, ao dedicar-lhe tempo de estudo, como forma de resistência à ambiência da guerra colonial, em Cabinda. Gosta de escrever e tem publicado textos, em jornais e revistas.

A GUARDA: No dia 13 de Julho, é apresentado, na Guarda, o livro «1908-1910 “Frades Jesuítas” Correm Portugal Pela Muita Tinta dos Jornais». O que é que o motivou a escrever este livro?

Manuel Sanches: O livro é sobre o final da Monarquia Portuguesa. Trata, na especialidade, a «Questão dos Frades do Colégio de Aldeia da Ponte». Nasci, aqui, na Rua do Colégio. Desde a minha infância, tenho assistido à ruína progressiva do grande casarão, ao qual todos sempre chamaram “O Colégio”. Estacar a morte anunciada do Colégio, nem que seja só uma estaca, para a retardar, a tarefa a que meti ombros, mediante a investigação documental, das memórias escritas.

A GUARDA: Onde, a que horas e por quem será apresentado o livro?

Manuel Sanches: Na Biblioteca Municipal Eduardo Lourenço (Guarda), em 13 Julho 2019, às 16.00 horas. Será apresentado pelo Sr. Professor Doutor António Rodrigues Lopes, das Ciências da Educação, muito dedicado ao Ensino Secundário e Superior. Com interesses vários, inclusive, pela Medicina Tradicional Chinesa, Poesia, Literatura e História.

A GUARDA: O que é a «Questão dos Frades de Aldeia da Ponte»?
Manuel Sanches: Requer tempo e espaço para responder, cabalmente. Mas o livro ajuda a responder. Os Padres Claretianos, com Casa-Mãe, em Aldeia da Ponte, estavam sujeitos aos Estatutos da Associação do Colégio. Tinham obrigações, e uma das obrigações fundamentais era o de administrar ensino. Foi questão minimizada, e até desleixada. Surgiram queixas de não cumprimento dos Estatutos, levadas até às autoridades. E outras queixas, inclusive, de pedofilia.
A imprensa tornou notória a questão, por todo o país. Os governos, de Ferreira do Amaral (1908), e de Teixeira de Sousa (1910), mandaram fazer sindicâncias à Associação do Colégio. O Rei D. Manuel II, com fundamento nos relatórios, mandou dissolver a Associação, e proibiu os seus associados de se reunirem.
Na prática, os Claretianos eram expulsos do país, sendo congregação espanhola. E há a questão: como é que os Padres do Colégio não sendo “Padres Jesuítas”, são expulsos como sendo “Frades Jesuítas”...

A GUARDA:O que é que o leva a afirmar que a «Questão dos Frades de Aldeia da Ponte» não tem merecido, por parte dos Historiadores, grande atenção?

Manuel Sanches: Eu passei os olhos por vários livros de Historiadores “consagrados”. Como digo, no livro, salvo excepções, caso de Rocha Martins, há historiadores que fazem uma curta referência, de meia dúzia de linhas, à expulsão dos Frades de Aldeia da Ponte. Outros, nem isso. No entanto, passando, a pente fino, jornais e revistas, nos anos 1908-1910, encontramos dezenas e dezenas de textos sobre a dita questão. Há, até, reportagens fotográficas. E caricaturas, que publico.

A GUARDA: Para saber o que se passou, no Colégio de Aldeia da Ponte, teve de fazer consultas e pesquisas de documentos. Como realizou todo esse processo?

Manuel Sanches: O meu Avô paterno, depois de passar pelo Colégio e pelo Telhal (Sintra), ingressou, em 1894, em Ciempozuelos (Madrid), na Ordem Hospitaleira de S. João. E o meu Pai esteve, em 1934, em Segovia, nos Claretianos. Procurei saber sobre essas estadias, falando com o meu Pai. Ele dizia-me que, em Segovia, tinha visto livros sobre o «nosso Colégio». Comecei a pedir documentação. Tive a sorte de encontrar pessoas “abertas” que me deram acesso às duas congregações. E, depois, foram as constantes idas ao Arquivo Nacional Torre do Tombo, Biblioteca Nacional de Lisboa, e outros arquivos e bibliotecas. Centrei-me muito nos jornais. Também no jornal A Guarda. Deu-me bastante informação.

A GUARDA: Durante as pesquisas, quais as situações que lhe despertaram mais interesse, no que se refere à presença dos Frades de Aldeia da Ponte?
Manuel Sanches: A temática do conflito, no Colégio, enquanto instituição. Abro um parêntesis. O conflito faz parte da dinâmica individual, grupal, institucional. Quando o conflito é permanente, se arrasta, e não é resolvido, acontece a doença, e até a morte.
O Colégio adoeceu, prematuramente. Tanto que abriu portas em 1892, e cerrou portas em 1897, 1901, 1910. Não foi só por razões económicas ou políticas. Houve muitos conflitos internos, conflitos externos-internos. O Colégio ficou submetido a muita pressão, a muita tensão.

A GUARDA: Como olha para o actual estado do Colégio que acolheu os “Frades”, em Aldeia da Ponte?

MPS: A família Cortes Chorão merece um elogio, não por serem meus familiares, mas porque cederam, a bem do Povo de Aldeia da Ponte, os seus imóveis, que integravam o Colégio. E foram dados passos burocráticos importantes, para recuperação de alguns dos seus espaços, inclusive da Igreja. Mas tardam as obras de recuperação dos edifícios. O que reforça o pessimismo, que já é crónico, vem de longe.