Entrevistas: Pedro Santos Leitão vencedor do Prémio Bolsas de Escrita Dramatúrgica, do Teatro Público Reservado e da Apuro
Pedro Santos Leitão venceu o Prémio Bolsas de Escrita Dramatúrgica, do Teatro Público Reservado e da Apuro. É natural de S. Pedro, Manteigas. Estudou na Escola Augusto Gil, na Santa Clara, no Liceu da Guarda, na Faculdade Direito da Universidade de Coimbra, foi aluno do Conservatório de Música de S. José (Guarda).Ouve música quase constantemente. Nos tempos livres costuma caminhar sem destino e gosta de conduzir por caminhos novos. Tem gosto em conhecer pessoas e conversar. Toca piano e guitarra. A GUARDA: O prémio Bolsas de Escrita Dramatúrgica, do Teatro Público Reservado e da Apuro, distinguiu o trabalho que apresentou a concurso. O que que é que o levou a participar?
Pedro Leitão: Foi o sentir-me finalmente confortável e contente com o resultado da peça que vinha a desenvolver. É frequente que me sente em frente do meu trabalho a pensar que lhe falta qualquer coisa para estar concluído. Passo horas a revisitar criações, a burilar textos, a alterar histórias, a fazer sofrer novas personagens... A peça (‘Um Dia na Repartição’) passou por esta espécie de processo de remodelação ao longo de quatro anos – o que começou por ser um episódio de vida deu mote a um poema, o poema explodiu em mil fragmentos de ideias dramáticas e por fim, de todos aqueles fragmentos aproveitei dez ou quinze que, depois de trabalhados, resultaram na peça submetida a concurso. Portanto, julguei que era altura de colocar o meu trabalho à prova, com os objetivos finais de levar a peça a cena e publicar o texto. Foi a vontade de concretizar esses objetivos que me levou a participar.
A GUARDA: Os vencedores, além de verem os seus textos editados, recebem um prémio monetário como incentivo à escrita de novas peças de teatro. Foi importante este incentivo?
Pedro Leitão: Sim. O concurso não só garantiu a publicação da obra como também concedeu um prémio monetário dividido em duas componentes: uma que premiava a peça a concurso e outra que consistia numa bolsa para, em 45 dias, produzir uma peça nova. Para qualquer artista, a liberdade de criação é um dos pontos mais sensíveis e importantes da carreira. Neste caso, vencer o concurso concedeu-me a oportunidade incrível de produzir uma peça inteiramente nova, em ambiente de total liberdade criativa, com a possibilidade de exploração de ideias em regime de quase exclusividade. Foi uma experiência fantástica na minha ainda jovem carreira.
A GUARDA: Sendo a sua formação em Direito também tem gosto pela música, pelo teatro e pela escrita?
Pedro Leitão: De facto a minha formação é em Direito. O Direito é uma das minhas paixões e convive perfeitamente com a paixão pela música, teatro e escrita.
A GUARDA: Como aparece a sua ligação ao Aquilo Teatro?
Pedro Leitão: No ano de 2017 regressei à Guarda depois de concluído o Mestrado em Direito e a desenvolver o estágio à Ordem dos Advogados. Voltei com muita vontade em integrar algum grupo ou entidade e participar ativamente na cena cultural da cidade. Mesmo no limite do prazo, deparei-me com um anúncio do Aquilo Teatro, na Internet, no qual se comunicava a abertura de vagas para atores com ou sem experiência, a fim de participar em produção teatral.Depois daquela primeira peça (‘Ao Natural’) apresentada no final do Verão de 2017 fui convidado para participar em outras atividades e produções. Com a maior participação, cresceu também o interesse pelo teatro e pelo funcionamento do Aquilo enquanto instituição. Finalmente, em 2021, fui convidado pela Direção do Aquilo Teatro para integrar a cooperativa, convite que desde logo aceitei com muito gosto, e que aproveito para agradecer a todos os cooperadores, em especial ao meu querido amigo Vítor Freitas, a quem devo igualmente toda a ajuda no processo de integração.
A GUARDA: E à Associação Hereditas?
Pedro Leitão: Com a Associação Hereditas a ligação tem um cariz diferente. Surge da realização de uma curta metragem no ano de 2020 (embora já me tivesse cruzado com o trabalho da associação e com alguns dos seus associados). O casting da curta estava a cargo da associação na pessoa do Daniel Branco. O Daniel, que tinha ouvido falar de mim através de um contacto em comum, convidou-me a fazer o trabalho, o que eu aceitei de imediato. Depois disso ainda tive a oportunidade de trabalhar com a Hereditas em mais algumas ocasiões, sempre como ator, e devo dizer que é uma associação de grande préstimo para a história e a cultura regionais, com uma dinâmica admirável, e com a qual tenho muito gosto em colaborar.
A GUARDA: Em termos culturais quais os projectos em que está envolvido actualmente?Pedro Leitão: De momento, além de projetos pessoais em fase de desenvolvimento criativo, voltados para a escrita, os restantes são embrionários ou estão em fase de apresentação de candidaturas. Assim, para evitar correr o risco de divulgar projetos cuja concretização ainda não está assegurada, prefiro deixar a resposta a esta pergunta em suspenso. A GUARDA: Podemos dizer que a Guarda é uma cidade cultural ou nem por isso?
Pedro Leitão: Devemos dizê-lo: A Guarda é uma cidade cultural. A Guarda (cidade, por um lado, município por outro) está dotada de infraestrutura física mais que suficiente para proporcionar a todos os cidadãos um acesso digno à cultura. A Guarda tem pessoas competentes e qualificadas, aptas a desenvolver um ecossistema cultural saudável, capaz de se apresentar como referência a nível regional e nacional. A Guarda tem associações e instituições de ensino adequadas a proporcionar formação cultural de qualidade à juventude.Devemos afirmar que a Guarda é uma cidade cultural. Devemos fazê-lo, claro está, sem o preconceito de declarar, em simultâneo, que há muito trabalho a fazer. É necessário um trabalho coordenado entre o poder político e as entidades atuantes no território, para não deixar que a cena cultural da cidade se transforme numa realidade fechada em torno de si própria. É necessário um trabalho de constante renovação que dê palco e reconhecimento aos agentes e artistas locais, mas não esqueça, em paralelo, de convocar formas inovadoras de agir e olhares externos, para que o espaço cultural da cidade não definhe por só se alimentar de si próprio. É necessário olhar para a cultura e para o desenvolvimento cultural enquanto fins em si mesmos, e não enquanto fontes de aproveitamento político ou económico.
A GUARDA: Como olha para o projecto da Guarda Capital Europeia da Cultura 2027?
Pedro Leitão: Com expectativa. Deixando de lado, à partida, considerações sobre a sua condução (que tanto é merecedora de crítica positiva como negativa), julgo que só o facto de ter havido processo de candidatura abriu novos espaços à exploração cultural na cidade. A Guarda, e toda a região, têm muitas potencialidades a nível cultural e, por isso, só a perspetiva de poder viver uma altura da história da cidade em que se pode desenrolar um ‘boom’ cultural deixa-me muito contente. Aquilo que espero, independentemente dos resultados da candidatura e da concretização (ou não) do projeto, é que o poder político local compreenda a necessidade de planeamento a médio-longo prazo. Espero que seja dado seguimento ao projeto para aprovação do Plano Estratégico Municipal da Cultura e que se assumam compromissos e consensos interpartidários sobre os destinos culturais do concelho. Espero que no processo sejam ouvidos os agentes e as associações culturais do concelho. Só assim se poderão lançar bases sólidas para alicerçar o futuro da cultura na cidade e salvaguardar a continuidade da construção desse mesmo futuro ao longo de vários anos.