Não sou cientista, mas, como se aproxima o Natal, guiado pelos pastores de Belém e os Magos do Oriente,

sigo o caminho das estrelas e vou cruzar-me com a ciência. Perdoem-me os cientistas por entrar no seu domínio, mas são eles os autores das muitas obras de divulgação científica que desafiam a curiosidade de todos, como são também eles que nos introduzem na beleza de uma qualquer lei do Universo expressa na simplicidade de uma equação matemática. Vamos pelo mais simples.Isaac Newton, um dos maiores cientistas da História, nasceu numa pequena aldeia inglesa, no dia 4 de Janeiro de 1643 do calendário gregoriano. Mas, à época, a Inglaterra ainda seguia o calendário juliano (a Inglaterra só adoptou o calendário gregoriano em 1752), segundo a qual a data de nascimento deste insigne cientista é 25 de Dezembro de 1642, ano da morte de Galileu. Aceitemos, então, que Newton nasceu no dia de Natal. Brilhante nos estudos formou-se em 1665 na Universidade Cambridge. É também neste ano que a Inglaterra se vê ensombrada com um grave surto da peste negra que atingiu particularmente Londres. Muitos estabelecimentos foram encerrados, incluindo a Universidade de Cambridge e Newton vê-se obrigado a regressar ao norte, à sua terra natal. A peste que vitimou um quarto da população londrina terá sido a oportunidade de Newton para um passo de gigante.É conhecida a narrativa. De caderno de notas e lápis na mão, encontrava-se Newton encostado ao tronco de uma macieira entusiasmado com cálculos matemáticos quando foi surpreendido pela queda de uma grande maçã que o atingiu na cabeça.- Olha… se fosse a Lua! Felizmente a Lua não cai! – Pensou o jovem cientista, para logo se interrogar:- Mas se a Lua não cai, por que razão não cai ela? Ou será que cai e que outra força lhe anula a queda?Foi desta maçã que Newton recebeu a inspiração para a sua teoria da atracção universal. Assim reza a lenda que vai atravessando gerações. A queda da maçã na sua cabeça poderá não passar de um pormenor fantasiado acrescentado ao que Newton terá contado a um amigo que fora a queda de maçãs que o levara a interrogar-se sobre a razão de elas caírem sempre perpendicularmente ao chão.Galileu construiu a sua “luneta”. Com ela pôde descobrir que as manchas da Lua eram montanhas lunares, tal como as que encontramos na Terra. Newton não terá sido o primeiro a conceber um telescópio reflector específico, mas foi ele o primeiro a construí-lo. Actualmente, como todos sabemos, os observatórios astronómicos encontram-se munidos de sofisticados e potentes telescópios. Com eles, e graças à luz, pode o Homem sondar as profundezas do espaço, recuar no tempo, explorar o passado do Universo e até reconstituir essa fantástica e magnífica epopeia cósmica que, a partir do já famoso Big Bang, que ninguém conhece o que o provocou nem o que existiria antes dele, conduziu ao seu nascimento e à era estelífera, a nossa era das estrelas. Entre o ponto de partida, o Big Bang em expansão, e a situação presente medeiam cerca de 14 mil milhões de anos. Número estonteante, sem dúvida! Os cientistas falam-nos de muitos outros números tão estonteantes ou mais. Mas fixemos primeiro o céu. Quem nunca o olhou cravejado de estrelas, sem luar e na escuridão do espaço, ainda não presenciou o espectáculo mais mágico que é dado observar ao Homem. Digo-o recordando os tempos da minha meninice em que fazia da varanda da casa de meus pais o observatório natural de onde contemplava essa beleza indescritível da abóbada celeste bordejada de estrelas, atravessada, quantas vezes, por “estrelas cadentes” e, de vez em quando, pelo pisca-pisca de um avião a rasgar o céu. Não possuía então livros de astrofísica como agora se encontram no mercado livreiro, mas aprendi a ler as estrelas. Foi assim que encontrei constelações e assim descobri, bem visível, a Via Láctea, a Estrada de Santiago como ouvia dizer.E hoje leio nos livros de astrofísicos que, para além da Via Láctea, o Universo actual possui centenas de milhares de galáxias, normalmente cada uma com um diâmetro de dezenas a centenas de milhares de anos-luz (Um ano-luz é a distância que a luz consegue percorrer no espaço de um ano, o que equivale a cerca de 9.500 000 000 000 quilómetros) e com milhares de milhões ou mesmo triliões de estrelas.E a nossa Via Láctea? Assim escreve o astrofísico vietnamita e professor na universidade da Virgínia nos Estados Unidos Trinh Xuan Thuan no interessante livro “A Vertigem do Cosmos: Uma breve história do céu”: «Actualmente sabemos que a Via Láctea contém cerca de 200 mil milhões de estrelas, ligadas entre si pela gravidade. Apresenta-se com um disco muito fino de 100 mil anos-luz de diâmetro e 1000 anos-luz de espessura… O Sol prossegue infalivelmente a sua ronda nesse disco… e arrasta o Sistema Solar através do espaço galáctico a 220 quilómetros por segundo (ou 790 mil quilómetros por hora). Desde o seu nascimento, há 4,55 mil milhões de anos, o Sol deu 18 vezes a volta à Via Láctea, levando 250 milhões de anos a fazer uma volta.» Números de estontear o comum dos mortais!No século XVI, com Copérnico, o sistema geocêntrico cede o lugar ao heliocêntrico e a Terra foi relegada para a categoria de um simples planeta a circular em volta do Sol. Agora é o próprio Sol que parece perder-se entre as centenas de milhares de milhões de estrelas que compõem a Via Láctea que, por sua vez se encontra perdida entre as centenas de milhares de milhões de galáxias do universo observável. Nem a Terra nem o Sol é o centro do Universo. É um Universo descentrado, idêntico a si mesmo em qualquer parte. Não há um lugar privilegiado. É o chamado “princípio cosmológico”.E nós, seres humanos? Como poeiras minúsculas sem espaço nem tempo rodopiamos, insignificantes, com a insignificante minúscula Terra arrastada pelo Sol no interior do Sistema Solar, insignificante também entre os muitos milhões de outras galáxias. Seres insignificantes na insignificante Terra de uma insignificante galáxia? Que sentido poderá ter a nossa situação no Universo? Se uns pensam que a existência do Homem não é mais do que obra do acaso, outros defendem que o Universo “tende”, desde o início, para o aparecimento da consciência. Vou por aí, integrando-me no alinhamento de muitos. O Homem não emergiu por puro acaso num Universo que lhe seria completamente indiferente. O Homem será antes o universo consciente de si mesmo. Só ou acompanhado. É o chamado “princípio antrópico” ou “princípio de consciência” que, por seu turno, perante a grandeza, a beleza, a harmonia, a unidade e a ordem cósmicas, indicia um princípio de transcendência, um “princípio criador”.Encontramo-nos em vésperas de Natal. Se é em razão da luz que o Homem pode viajar ao passado, agora, aos olhos da fé, é a Luz de Belém que, revelando o sentido do passado, projecta o Homem no Futuro Absoluto. Chamemos-lhe “princípio crístico”. Naquela gruta opera-se o milagre da misteriosa síntese de contrários: o Infinitamente Grande e o infinitamente pequeno, a Infinita Plenitude e a pobreza infinita, a infinita Palavra e o gemido silente de uma criança; a Luz criadora e a escuridão da noite, o Infinito Poder e a fragilidade infinita do humano. Milagre mais admirável que o número de estrelas do Universo.O Big Bang do início do tempo cósmico abre-se ao Big Bang do Espírito Eterno. Desfez-se a rosa-dos-ventos: o Norte funde-se com o Sul e o Oriente com o Ocidente. Agora o pólo de sentido da Humanidade e do Universo está ali na Luz da manjedoura  de uma cabana de animais. E não há pandemia nem crise que apague esta Luz, como lembra o Papa Francisco. Cristo verdadeiramente humano é também é também “Cristo Cósmico”. Santo Natal.Guarda, 13 de Dezembro de 2020