Nunca souberam o que era fazer uma campanha nem tiveram que pedir votos,

não tinham máquina partidária, mas empunhavam uma espada. Uma espada por cujo fio muitos foram passados em manifestações de atos de valentia, por meros ajustes de contas e feitios ou tratamentos radicais de traições e outras manifestações vulgares da natureza humana.Em mais de 900 anos de História, Portugal teve de tudo à frente dos seus destinos. Entre reis e governantes houve líderes carismáticos, figuras medíocres, músicos e artistas plásticos, algumas nulidades e, mais recentemente, uns tantos atores.Os atores dos dias que correm já se suportam em máquinas e disciplinas partidárias. Formam assim uma espécie de companhia teatral, sem qualquer ofensa para aqueles que fazem honestamente da representação a sua forma de vida. Além de nome próprio, os reis também tiveram um cognome, uma espécie de alcunha relacionada com feitos notáveis, com atributos físicos ou traços de personalidade.Essa tradição de alcunhar governantes perdeu-se, e mal, com a implantação da 1º República, mas não se perderam as razões que motivariam essas mais (im)próprias denominações.Seria muito exaustivo estar aqui a referir a extensa lista de reis e governantes que ocuparam o mais elevado cargo de governantes da nação, mas cingir-me-ei aqueles que pela importância da sua ação, para o bem e para o mal, entendi como razões da minha escolha.Assim e como não poderia deixar de ser, começaria por D. Afonso Henriques, que teve o cognome de “O Conquistador”, pelas numerosas conquistas que fez aos mouros e pela garantia de (in)dependência que deu a este retângulo, para alguns dourado e para outros muito trabalhado. Sucedeu-lhe D. Sancho I que teve o cognome de “O Povoador” por ter mandado povoar as terras conquistadas pelo pai. Também foi poeta com fortes ligações afetivas à Guarda. A Ribeirinha que o diga.Não vou perder muito tempo com D. Afonso II “O Gordo”, devido a uma mera caraterística física ecom um pequeno salto situar-me-ia em D. Dinis que foi cognominado de “O Lavrador” por ter defendido muito a agricultura e plantado o pinhal em Leiria, que perdurou até 2017, altura em que um incêndio o consumiu. Uma outra personalidade que invoca amores platónicos e paixões arrebatadoras foi D. Pedro I, cognominado de “O Justiceiro” por ter aplicado uma justiça rigorosa e severa, igual para todos. Que o digam Pero Coelho e Álvaro Gonçalves, assassinos de Inês de Castro, ou Afonso Madeira, seu escudeiro, que mandou capar por andar a dormir com uma mulher casada. Ou terá sido por ciúmes?Mais adiante encontramos D. Duarte com o cognome de “O Eloquente”, pelo seu grande amor às letras. Era muito letrado e bondoso. Entre outras obras escreveu três livros notáveis: “Leal Conselheiro”, “Arte de Bem Cavalgar Toda a Sela” e “Livro da Misericórdia”. Não podia ser passado sem qualquer referência.Depois de “O Africano” e de “O Príncipe Perfeito” chegamos a D. Manuel, I “O Venturoso”, por ter sido sempre afortunado com os grandes descobrimentos no seu tempo. Marcante para a História do país.Se a D. Sebastião deram o cognome de “O Desejado”, por ser muito pretendido antes de nascer, poderia ter sido o “Sempre Esperado”, depois de muito jovem morrer.Chegados à dinastia filipina, eis que D. Filipe I foi cognominado de “O Prudente”, pelas grandes promessas feitas nas cortes de Tomar, a fim de conquistar a simpatia dos portugueses. A relevância deste período de má memória para Portugal tem a ver com o paralelismo que se pode estabelecer com a situação política que atualmente estamos a viver. Daí não poder deixar de fora D. Filipe II que teve o cognome de “O Pio”, pelo seu sentimento religioso, mas que levou Portugal à bancarrota, com os aumentos de impostos e a ruína da agricultura, do comércio e da indústria. D. Filipe III teve o cognome de “O Grande”, mas os portugueses alcunharam-no de “O Opressor”. Neste reinado o domínio espanhol tornou-se violento. Esperemos que a pandemia da Covi-19 não seja usada como razão para o regresso da opressão e decadência política e económica.Seguiu-se D. João IV “O Restaurador”, por ter restaurado a independência. Não sei se será também João o nome dele, mas que Portugal está necessitado de um restauro, está. Venha ele.D. José I foi “O Reformador” devido às grandes reformas que se fizeram no seu reinado. Acabou com a escravatura em Portugal Continental e concedeu a liberdade aos índios do Brasil. Também acabou com a distinção entre cristãos-novos e cristãos-velhos. Chegados ao Século XXI estamos a braços com novas formas de escravatura, a escravatura fiscal que subjuga cristãos, sejam ou não novos, não perdoando a judeus, muçulmanos e outros seguidores de confissões religiosas com menos devotos no nosso país.D. Maria I foi chamada de “A Piedosa”, pelo equilíbrio, competência e progresso espiritual e material que a sua governação trouxe ao país e D. João VI teve o cognome de “O Clemente” devido à sua bondade e disposição em perdoar. D. Miguel teve o cognome de “O Absolutista” por ser partidário de uma monarquia absoluta, um tique muito notório e notado nos atores políticos de hoje. D. Maria II foi “A Educadora” pela esmerada educação que deu a seus filhos. Um exemplo onde poderiam ir beber as atuais gerações, com a Educação a caminhar pelas ruas da amargura.D. Luís I teve o cognome de “O Popular” pela maneira como convivia com todos os Portugueses. Muito culto e bondoso, D. Luís I nunca se revelou capaz de cuidar dos males que afetavam a sociedade daquele tempo, devido à incapacidade governativa, à irresponsabilidade parlamentar e à falta de uma consciência unificadora e patriótica. Onde é que eu já ouvi e convivi com isto?Como é que a história se repete passados uns séculos?Deixando a monarquia e olhando para a República, principalmente a terceira, também poderíamos alcunhar alguns dos nossos supremos (ou nem tanto) magistrados da nação.Seria exagerado um cognome de “Bochechas”, pelas caraterísticas físicas ou uma alcunha de “Múmia” por traços psicológicos? Parece-me que não seria descabido nem ofensivo.E se no presente cognominássemos um António de “O Distraído” e um Marcelo de “O Míope”?O primeiro pela simples razão (e não é pouco) que deixou voar 850 milhões de euros dos cofres que governa; o segundo porque fez de conta que não viu, não soube e ainda apoiou a distração (ou encenação) do primeiro, continuando a passear a sua cultura e afetividade, esquecendo-se que os problemas do país são uma realidade.Foi assim que dos guerreiros aos poetas, passando pelos reformadores e povoadores chegámos a uma realidade de atores. Eu, como D. João VI, até poderia ser “Clemente” e gostar de perdoar, mas, mesmo assim, preferia mudar.