Livro das Igrejas, Padroados e Direitos Eclesiásticos da Ordem de Nosso Senhor Jesus Cristo – 1571 


Este livro foi mandado fazer pelo rei D. Sebastião, por alvará de 28 de julho de 1571, ao Dr. Pedro Álvares, do seu desembargo, e seu desembargador da Casa da Suplicação.O livro digitalizado com que nos presenteia a Torre do Tombo, é uma cópia de leitura acessível, graças à boa caligrafia do copista. Faz um relato pormenorizado dos direitos eclesiásticos que a Ordem tem nas várias Igrejas, Padroados e Comendas.O objetivo era reunir toda a documentação relativa aos direitos que a Ordem de Cristo tinha nas Igrejas e Padroados onde possuía Comendas, para exercer os seus direitos e evitar os abusos alheios.A recolha foi frutífera, recuando muitas vezes à Ordem do Templo, incluindo documentos escritos em Latim, devidamente traduzidos. Inclui também dados fornecidos pelos Visitadores da Ordem às Comendas, tendo como referência o Capítulo Geral de 1503, no tempo de D. Manuel I, e pontualmente, dados recolhidos de outras Visitações posteriores àquela data.Por motivos óbvios, vamo-nos restringir ao “Título das Igrejas que a Ordem tem no Bispado da Guarda”, cujo relato se inicia a partir da página 97, fazendo pouco mais que a enumeração das mesmas, e deixando à curiosidade dos eventuais interessados o aprofundamento do tema. Há, no entanto, alguns aspetos que mereceram a nossa atenção, a saber:
1. Relativamente a algumas Igrejas o cronista não encontrou disposições recentes, mas sim acordos estabelecidos entre o Bispo e Cabido da Diocese da Guarda e o Mestre da Ordem do Templo, portanto anteriores ao século XIV. Estão nessa situação as Igrejas da Idanha a Velha e de Castelo Branco e Ródão. São documentos escritos ainda em latim, seguidos da respetiva tradução, e da descrição do que respeita a cada uma das Igrejas.2. Nestes acordos estão incluídas não só as Igrejas das localidades referidas em primeiro lugar, mas também de outras de Igrejas de outros lugares da Diocese que eram comendas da Ordem de Cristo, ou nas quais esta tinha direitos.3. A descrição é exaustiva, e a título de exemplo ficamos a saber que as Igrejas de Stª Maria e S. Miguel, de Castelo Branco, tinham também 4 beneficiados, com uma renda anual fixada em 3.000 réis para cada um, apresentado os despachos de nomeação emitidos pelos reis.4. Também é esclarecedora sobre os valores da divisão da dízima entre o Bispo e a Ordem, que tanto podia ser a meias, como o Bispo ter apenas direito a um terço ou a um quarto. O mesmo se diga em relação às primícias, aos frutos da terra, aos rendimentos do trabalho, etc., havendo casos em que a partilha é feita e outros em que a totalidade reverte para a Ordem.5. Não há uniformidade em todas as Igrejas quanto à existência das próprias dízimas. Casos há em que os fregueses só estão sujeitos ao pagamento daquela a partir de determinados valores de produção, como, por exemplo, só a partir de x alqueires de pão ou de trigo e de x almudes de vinho.6. Integra também o cronista os dados colhidos pelos Visitadores da Ordem em diferentes ocasiões, no que respeita à apresentação dos vigários e curas e respetivas porções (e quem as paga), ao estado das Igrejas, se necessitam de obras e quem as deve suportar, às fábricas das Igrejas e sua organização, e até se o Comendador deve contribuir ou não.7. Um dos dados recolhidos pelos Visitadores chamou a nossa atenção e diz respeito à Igreja de Silvares. Com efeito, queixaram-se os fregueses de que o cura, que estava obrigado a celebrar missa todos os domingos, nas festas de Nossa Senhora e dos Apóstolos, nem sempre comparecia (vivia a 2 léguas de distância) para cumprir as suas obrigações, acontecendo, por vezes, que as pessoas morriam sem “confição” (sic).
Quadro 2: Igrejas em que a Ordem de Cristo tinha direitos Eclesiásticos na Diocese da Guarda em 1571As últimas três Igrejas que constam do documento, Longroiva, Mêda e Muxagata, pertenciam (e pertencem) à diocese de Lamego, razão por que não constam do quadro.O capítulo dedicado à Diocese da Guarda, inclui ainda uma lista das Igrejas do Padroado que foram convertidas em Comendas, bem como outra lista das comendas ditas dos “vinte mil cruzados”.Se à data de 1571 o território do bispado de Lamego tinha uma dimensão muito superior à atual, abrangendo os concelhos de Figueira de Castelo Rodrigo, do Sabugal e de Pinhel, que agora pertencem à Diocese da Guarda, não sabemos a razão que levou o cronista a não separar as dioceses.
O quadro que se segue, diz apenas respeito às igrejas que atualmente integram a Diocese da Guarda, mas que naquela data pertenciam a Lamego.
Quadro n.º 3: Igrejas da Diocese da Guarda que integraram as Comendas do Padroado e dos 20.000 cruzados:
Nota *: Os termos da tomada de posse destas comendas, em Latim e em Português, podem ser consultados no livro de Isabel Morgado Silva, “As comendas Novas da Ordem de Cristo – séc. XVI”, Porto 2012, p. 186 e seguintes. O início do processo teve lugar em 29.05.2015 e consta da Gaveta VI, maço n.º 15, do ANTT.Outras enumerações posteriores existem, como é o caso da “Lista de Todas as Comendas que há nestes Reinos de Portugal, da Ordem de Cristo, da apresentação de sua Magestade (sic) e do Duque de Bragança”, feita em junho de 1615, existente na Biblioteca Nacional em códice microfilmado, por nós consultado, bem como em livros do século XVII e XVIII que serão do conhecimento de muitos.Esta pequena abordagem não é mais do que uma chamada de atenção para a existência de algumas fontes, menos conhecidas, que nos podem ajudar a conhecer e compreender melhor a história local e regional.