No Domingo passado vimos que Jesus, na hora da despedida, na Última Ceia, deixava aos seus discípulos, como herança, o mandamento novo do Amor.

Esta semana, o evangelista João apresenta-nos mais duas dimensões dessa mesma herança, que se completará no dia de Pentecostes: a paz de Jesus e o Espírito Santo. Escutámos: “Deixo-vos a paz, dou-vos a minha paz” (Jo 14, 27); e ainda: “O Espírito Santo, que o Pai enviará em meu nome, vos ensinará todas as coisas e vos recordará tudo o que Eu vos disse” (Jo 14, 26). Contudo, uma das afirmações mais curiosas deste texto é aquela em que Jesus fala da morada de Deus. De facto, este assunto sempre inquietou a humanidade. Já as antigas religiões naturais, algumas até mais antigas que o judaísmo, se questionavam sobre a morada do ‘transcendente’. Onde é que Deus habita? Onde construiu Ele a Sua morada?

Para as religiões antigas Deus era de tal modo inacessível, longínquo, que só se poderia alcançar por meio de mediações sagradas, ou seja, através de figuras representativas, ou em espaços sagrados como templos e santuários. No politeísmo grego a morada dos deuses era o monte Olímpo. No monoteísmo judaico o Templo de Jerusalém era a morada de Deus entre os homens. A partir de Jesus isto deixa de fazer sentido, pois Ele diz à samaritana que já não é em Jerusalém, nem em santuários feitos pelas mãos dos homens que se adorará a Deus: “os verdadeiros adoradores hão-de adorar o Pai em espírito e verdade” (Jo 4, 23). E aos discípulos, no Cenáculo, acrescenta que é na própria humanidade que Deus fará a Sua morada (Jo 14, 23). Com Cristo, é no coração dos homens crentes que Deus habita. Somos, em Igreja, “templos do Espírito Santo” (LG 6).

Podemos, então, dizer que Deus habita naqueles que o amam e guardam a Sua palavra. Somos tabernáculo de Deus, não só quando o comungamos, mas também quando reflectimos o seu rosto através das obras de misericórdia. Transportamos a divindade de Deus na nossa vida. Por certo seria a isto que aludia Santo Ireneu, bispo de Lyon no século II, quando dizia que “a glória de Deus é o homem vivo”. Somos espelho de Deus. Somos a Sua morada. Por isso a vida humana tem valor divino. Um valor que talvez nem sempre apreciemos e respeitemos. Esta é a razão pela qual a fé católica diz que a vida humana deve ser respeitada, desde a concepção até à morte natural. E é também por isso que não abandonamos a vida, mesmo quando é afectada pela doença, ou pelas limitações da velhice. Cuidamos da vida, pois ela é sinal e manifestação da presença de Deus.

Senhor Jesus, vem habitar o meu coração! Vem e transforma a minha vida em Tua morada! Faz de todo o meu ser Tabernáculo de Deus, Templo do Espírito Santo, Corpo Teu, pedra viva da Tua Igreja. Torna-me um apaixonado defensor da vida, capaz de a cuidar e reconhecer sempre nela a presença de Deus.
Amén.