Assinou-a no sábado passado, em Assis

Quis que S. Francisco, de quem tomou o nome, ao ser eleito Papa, fosse a fonte inspiradora desta carta encíclica, como já o tinha sido para a outra publicada há cinco anos, com o nome de “Laudato sí”, sobre o valor e o respeito que devemos à criação.Como se diz no seu título, esta encíclica, que leva o nome de “Todos irmãos”, trata da fraternidade e da amizade social.A sua proposta inspira-se na visita de S. Francisco ao sultão do Egipto, em tempos difíceis da conjuntura internacional, pois era o tempo das Cruzadas, para lhe apresentar o sonho de uma sociedade fraterna.O Papa não ignora que o nosso ponto de partida está muito longe do cumprimento deste sonho, pois estamos numa sociedade fechada, sem que haja projeto de vida para todos, com a continuada tentação do descarte, ou seja de empurrar para fora os que não interessam. Por sua vez, os direitos humanos ditos universais, de facto ainda estão longe de terem efetiva universalidade para todos. O mesmo acontece com a globalização, que continua a segregar.A este mundo queremos preferir outro mundo, que ele chama mundo aberto. Pretende-se que seja um mundo ba-seado na lei do amor, com sociedades efetivamente abertas, porque determinadas a integrar a todos, promotoras do bem moral e que se sabem organizar em função do princípio de que os bens foram criados para todos e daí a função social da propriedade privada.Para passarmos do mundo fechado que temos, mas não serve, para o desejado munda aberto, o Papa propõe que revisitemos todos a parábola do Bom Samaritano, onde próximos são todos, num mundo sem fronteiras o que fica demonstrado por aquele estrangeiro que se antecipa ao sacerdote e ao levita, à partida com mais obrigação de atenderem o seu concidadão caído à beira da estrada, mas preferiram passar ao largo.Para fazermos caminho conjunto rumo a este mundo aberto, precisamos primeiro que cada um tenha um coração aberto ao mundo inteiro, sem desfazer a  sua identidade, mas sempre disposto ao diálogo e à cooperação com  todos.Precisamos também de uma política melhor, efetivamente empenhada em promover o diálogo e a amizade social, uma política que integre e reúna a todos e nos entusiasme pelo sonho de sabermos construir juntos. Uma política que necessariamente tem de procurar consensos, mas sempre baseados na verdade, que muitas vezes não coincide com os interesses e as conveniências em jogo.Para chegarmos a esse mundo aberto temos todos de nos empenhar em promover uma nova cultura, que o Papa chama cultura do encontro, onde a gestão dos conflitos, sempre inevitáveis, se faça sempre com o sentido do bem de todos.Da Fé Cristã, como do conjunto das religiões, há muito a esperar para a construção deste mundo aberto e o seu papel é insubstituível, apesar das dificuldades que, pelo menos em alguns mundos, lhes estão a ser criadas, incluindo o risco da instrumentalização a que também se encontram sujeitas.Não só a Igreja mas também as sociedades em geral têm razão para estarem agradecidas ao Papa Francisco pelas propostas que nos faz nesta encíclica.
4.10.2020+Manuel R. Felício, Bispo da Guarda