Peregrinar com os gestos, movimentos e deslocações rituais tornou-se nota inalterável praticamente em qualquer crença da humanidade.

Com a meta prevista e o bordão de apoio para o caminhar, com as contrariedades adjacentes aos sacrifícios a que obriga, e os significados interiores vividos na alma, tem um distintivo eminentemente espiritual.
É símbolo da existência humana, por entre insólitas metas, procurando constantemente, desde o nascimento até à morte, a abertura à transcendência, no caminho visto como espaço a percorrer, aonde também se juntam mais realidades sacrossantas, conforme o testemunho de cada crença. Assumindo o desapego ao lugar, onde se mora habitualmente, almejando o terminal do anseio apetecido, com as oportunidades de contemplação e prece, o romeiro pretende saborear os mistérios divinos, pelo encontro com as realidades espirituais e até com outros seres tocados pela divindade
Geralmente, o santuário, presença de memória ou profecia, ou outro lugar marcado pela intervenção do sobrenatural, aponta o termo da romagem e apresenta-se-nos como lugar da reunião, onde, com pessoas da mesma índole religiosa, se vai robustecer a fé em idênticas orações e súplicas. Aí, as vivências partilhadas no conjunto de cerimónias ou rituais, firmam a união com quem revigorou nesse local, a sua fé, aprofundam o sentido do viver humano, segundo a perspectiva divina, na luz aberta aos problemas interiores e nas alegrias vividas por entre amarguras e ansiedades.
Não caminham para estes lugares de pacificação e de graça somente os crentes mais fervorosos mas talvez, em maior número, os que cumprem somente uma piedade bastante superficial denominados no cristianismo, praticantes de piedade popular. Não que não tenham mais fervor e observem melhor os preceitos piedosos em comparação com os demais, pois entre eles podem encontrar-se riquezas de fé profunda: entrega generosa à providência de Deus tratado como Pai amável e sempre cuidadoso de seus filhos, a viveram o ser religioso com uma fé pouco instruída mas profunda e leal, caritativa e paciente, com um sentido da sofrimento acrisolado e perspicaz, aceitação dos outros e atentos às suas necessidades e muitas outras virtudes que, às vezes, não abundam nas classes mais praticantes.
Nas grandes romarias e peregrinações consideráveis, em muitas devoções bem reivindicadas e assumidas por enormes multidões, pode entender-se melhor o coração do povo cujas crenças vêm, por séculos, de seus antepassados.
Será sobretudo no meio destas multidões sem número que se encontram tantos milagres de conversão, tamanhas mudanças de vida até para a santidade profunda e canonizada mais tarde, que se podem descobrir, pelos séculos de história, casos extraordinários e assombrosos.
Não podemos, por falta de espaço, lembrar que tantas romarias principiaram com a frequente visita aos lugares sagrados, onde Jesus ou mesmo outros iniciadores de religiões marcaram o seu existir, e às campas dos santos, benfeitores ou familiares para recordar a sua memória e manter os afectos de tempos idos.
Também factos inexplicáveis e sobrenaturais são lembrados como eventos ligados a acções de pessoas tidas como enviados por Deus.
Modernamente, como expressão de experiência religiosa, visando santuários, ermidas, mesmo capelas ou túmulos de santos, as romarias, talvez por facilidades de transportes, estão-se multiplicando. Nem sempre tendem para reacender centelhas religiosas, pois o passeio, as companhias têm aí o seu lugar, mas a presença de multidões devotas a comunicarem piedade com amor a Deus e aos santos, juntamente com a ambiência circundante e o testemunhar de tanta oração simples e sincera, fazem estremecer as almas e penetrar nelas sentimentos sagrados. Depois vem o repensar a vida e orientá-la para uma conversão sincera.
O que se torna necessário será a orientação respeitosa e autêntica para não perturbar a espiritualidade mística e o sentido religioso de quantos vivem ou querem viver as suas crenças interiores.
As procissões, as vias sacras, os sermões são muito valorizados e pedem mais apreço e reverência, para que se não possa perturbar a motivação religiosa de quantos se incorporam piedosamente nestes actos que buscam a espiritualidade de tantos crentes.