Com temperaturas mais elevadas e com a satisfação de olharmos os campos, a exibirem os belos e excelentes frutos tão necessários à vida dos homens e animais,

nem nos damos conta que os dias vão já diminuindo. Prosseguimos os contactos com a natureza e o descanso de férias, talvez à beira-mar, com passeios e digressões a ver os amigos e fazemos as festas tradicionais tanto profanas como religiosas.
Para além deste mundo criado, a nossa contemplação há-de estender-se para tantas maravilhas executadas pela arte humana, pois nos revelam o engenho e a perícia dos nossos maiores, a história e o progresso do seu pensar e agir, as tradições e costumes a deixar-nos perceber melhor a alma dos antepassados e as raízes donde surgimos.
No perspectivar dos sucessos de antanho, por toda a parte e pelas diferentes idades, aparece um fenómeno universal, embora com variados matizes: a religiosidade dos nossos avoengos, a mostrar-se bem clara, desde as aldeias vizinhas até aos confins da terra.
Detenhamo-nos apenas no espaço por nós conhecido e verifiquemos as igrejas e catedrais, os santuários e ermidas e saibamos perscrutar quanto tudo isto nos revela de transcendente e admirável, para aí aprendermos o que pensa e vive a inteligência e o coração humanos.
Que falta fazem os templos na cumeeira dos montes ou nas encostas de colinas desabitadas? Para quê gastarem-se tanto trabalho e tanta mão de obra com materiais exóticos e delicados nada aproveitáveis para a nossa vida terrena?
Os cuidados postos nestas obras simples ou a transbordar sumptuosidade esplendorosa e magnificência deslumbrante que têm dado à humanidade, através dos séculos? E se repararmos nos seus interiores, que nos ditam o regalo dos retábulos, o requinte dos altares, o equilíbrio das proporções arquitectónicas, o esmero e luzimento de tantas imagens e pinturas?
Introduzimo-nos, quando visitamos tais monumentos, num ambiente não estranho mas a requerer consideração atenta e ainda exame arguto.
É que penetramos na esfera do sobrenatural e do sobre-humano nessas representações curiosas herdadas, às vezes, da pré-história, a mostrar a ânsia dos nossos ascendentes ávidos de fixarem relações com o mundo conhecido e as forças ocultas por eles adivinhadas, no seu íntimo.
Interpretando o mundo como epifania do Criador, pois, desde a antiguidade, o sábio descobrira que qualquer realidade deveria ser formada pelo Eterno, as mentes lúcidas e perspicazes foram descobrindo seus atributos e ensinando aos contemporâneos inventos deixados em indícios reveladores.
A manifestar as realidades pressentidas, os artistas pegaram nos seus instrumentos e procuraram reter, em figuras ou símbolos, quanto perscrutaram no seu coração. O significado destas obras ainda não foi totalmente decifrado, embora se perceba invadirem os apelos de nossas aspirações profundas.
A linguagem iconográfica é tornada mais abundante, à medida que passam os séculos. E hoje, podemos deliciar-nos com a descoberta do seu significado e compreender a razão por que divisamos, em diferentes religiões, tantos sinais e emblemas a apoiarem o homem hodierno nos seus sentimentos sagrados.
No catolicismo, nem sempre se admitiu a figuração de imagens, com receio de serem tornados ídolos ou desviarem a atenção da palavra divina, verdade autêntica, e ficarem tão somente no simbolismo.
A obra de arte inspirada na crença não terá muito de original, abstraindo o testemunho de fé, mas, quando já realizada, é inegável que alcançou indiscutível valor para a formação religiosa das gerações dos cristãos que a contemplaram.
É que ela pretende fixar quer na arquitectura quer na iconografia ou mesmo nos painéis, as crenças de seus autores e oferecê-las aos vindouros. Tornam-se, deste modo, vias de transmissão da fé, forma de manter a piedade, processo de relembrar tanto os mistérios de Cristo como as virtudes vividas nos santos, a fim de melhor se imitarem os seus merecimentos.
Já um Padre dos primeiros séculos escrevia: “Se fazemos imagens de homens piedosos não é para adorá-los como a deuses, mas, para que, contemplando-as, sintamos o impulso do seu estímulo; de igual modo esculpimos a imagem de Cristo para que inflame em nós o seu amor”.
O culto dos santos recorda-nos a fonte da graça que, mesmo em nós, pode fazer maravilhas, pois neles se nos mostra a coerência e a beleza da fé na vida.
Não é a primeira vez que, na Igreja, a observação de um quadro  ou imagem de bem-aventurados transformou o íntimo de um crente, levando-o até à santidade. Recordemos o testemunho de São João Damasceno: “Quando cansado de estudar, disponho de algum tempo livre, vou voluntariamente à igreja e contemplo os quadros. E a glória de Deus desce sobre a minha alma e adoro a Deus nos testemunhos de seus eleitos”.