Mui difícil se torna para a nossa linguagem humana, depois de haver perscrutado a essência de Deus, revelá-la em termos divinos que roçam o infinito.


Para compreender a maravilha do Omnipotente e investigar o seu deslumbrante e assombroso Ser, necessário se torna ultrapassar a lhaneza do nosso universo e penetrarmos com respeito incontido na maravilha da sua infinitude. Mas, para contarmos a sua vinda ao meio dos homens, e termos de unir o Incomensurável na limitação bem confusa do ser humano, o problema torna-se caótico, pois não sabemos como reunir no mesmo ser duas naturezas tão distintas: uma incriada e outra nascida num mundo tão limitado. Além disso, tal prodígio acontece com uma finalidade bem determinada: redimir, num mistério de amor, um ser criado que se corrompeu por sua livre vontade.
Aqui mora o enigma inicial da incarnação do Verbo que Se faz homem para salvar o mundo, sem lhe subtrair o chamamento à união e amizade, fazendo o encantamento recíproco tão difícil de compreender. Tal história humana e divina envolve o relato do amor que nos veio redimir e convidar-nos à amizade mútua e feliz que pretende concluir-se num amplexo eterno e recíproco.
O Natal é a lembrança reconfortante que marca o início deste evento que o credo sintetiza: “O Verbo divino incarnou e habitou entre nós”.
“No princípio era o Verbo e o Verbo estava em Deus e o Verbo era Deus” – assim começa a narrativa maravilhosa que nos abre e vai terminar com estas palavras: “E o Verbo Se fez carne e habitou entre nós e nós vimos a sua glória”.
Porque estes dizeres eram e continuam a ser o fundamento do mistério cristão, muitos dos nossos antepassados na fé gravaram-nos em medalhas de ouro ou prata para trazerem suspensas sobre o peito.
Estas verdades de fé eram lidas em todas as missas como despedida das assembleias cristãs e muitos crentes as rezavam de cor.
Embora, na simplicidade do seu escrever, o evangelista não usasse termos difíceis e deslumbrantes, soube resumir aí o sumário da teologia cristã no qual se podem ver as mais importantes matérias da nossa fé: soberania, transcendência e divindade do Verbo, sua proximidade e vida concreta com os homens, aparecimento perante o mundo, acção salvadora do Verbo em favor dos homens, atitudes diferentes dos homens perante o Deus incarnado, encargo de João Baptista como testemunha e revelador de tão grande mistério.
Depois, seguir-se-á com o decorrer do livro, a demonstração explanada dos factos concretos que nos manifestarão os actos salvíficos feitos por Jesus para salvar todas as almas que se acolherem ao seu amor e à sua graça, desde a pregação até à morte na cruz seguida pelo testemunho da gloriosa ressurreição realizada, ao terceiro dia, após a trágica descida ao túmulo.
Apesar de não ser das primeiras comemorações dos mistérios da redenção, o povo crente, na sensibilidade com que se tratam as crianças envolveu os primeiros acontecimentos da vida de Cristo numa auréola de carinho, ternura e delicadeza.
Por isso, tornou-se, em muitos lugares, festividade mais popular e celebrada, ultrapassando na piedade religiosa as comemorações fundamentais da paixão, morte e ressurreição do Senhor, isto é, as festas pascais da redenção.