Parecia um milagre da Senhora do Soito.

Durante a festa anual, que se celebra desde há várias décadas, no segundo domingo de Maio, o recinto da capela foi literalmente invadido por largas centenas de ovelhas. As primeiras, mais de duzentas, vinham enfeitadas a rigor para a festa, em forma de agradecimento. Logo a seguir, o resto do rebanho, em número muito maior, também ajudou os pastores a cumprir a promessa.
Numa terra em que da pastorícia e da transumância restam apenas os pastores, a presença de tantas cabeças de gado acabou por causar surpresa e encanto. Os mais velhos rejuvenesceram uns anos, recordando tempos idos, não só nas encostas da Estrela mas também nas campinas da Idanha, quando ainda se fazia a transumância.
Antes da tradicional corrida, à volta da capela, houve tempo para a bênção de pastores e dos rebanhos. Um gesto simples mas sentido por quem acredita e pede a protecção divina. Depois das aflições do último Verão, com a Serra varrida pelas chamas, estar na Senhora do Soito foi muito mais do que cumprir uma promessa.
Desta vez as ovelhas vieram do outro lado da Serra, dos lados de Gouveia, e conhecem bem as pastagens de todo o Parque Natural, pois os pastores têm laços familiares em Famalicão da Serra. A encosta nascente da Serra voltou a ouvir o som das campainhas e dos chocalhos, voltou a sentir o cheiro intenso e único dos rebanhos. A Serra voltou a ser Serra e precisa de continuar a ser Serra e só o será com a presença de pessoas e animais.
De uma vez por todas é necessário olhar para estes lugares pelo que são realmente e criar condições para que às artes e ofícios tradicionais se associe qualidade de vida. Só assim será possível continuar a cativar os mais novos para que a Serra tenha futuro e vida.