Entrevista: António Pimentel Lourenço - Presidente da Direcção da Associação Humanitária dos Bombeiros Voluntários de Foz Côa

António Pimentel Lourenço nasceu na freguesia de Moreira de Rei, concelho de Trancoso, mas viveu toda a sua infância e juventude na então vila de Mêda, passando a residir no concelho de Vila Nova de Foz Côa, após o casamento. Frequentou a escola primária e o então Externato de Santo António na Meda, vindo a completar o ensino secundário na Escola Profissional de São João da Pesqueira. Reformado da actividade bancária exercida na Guarda e em Vila Nova de Foz Côa, ocupa a maior parte dos chamados tempos livres com o voluntariado, numa fase anterior, à criação do Lar de Idosos e Centro de Dia de Chãs e mais recentemente na Associação Humanitária dos Bombeiros Voluntários de Vila Nova de Foz Côa, Vice-Presidente da Direcção da Douro Superior – Associação de Desenvolvimento e membro do Conselho Geral do Agrupamento de Escolas de Vila Nova de Foz Côa. Gosta de ler e de viajar pelo país e estrangeiro, conhecer novas culturas. Valoriza a família e os amigos. A GUARDA – Como apareceu a Associação Humanitária dos Bombeiros Voluntários de Foz Côa? 
António Lourenço – Em 17 de Julho de 1930, numa modesta casa no Largo da Conceição em Foz Côa, vivia um casal com um recém-nascido. Durante a noite deflagrou um violento incêndio e só o marido conseguiu salvar-se .  A esposa e a criança morreram abraçadas e carbonizadas.Este pavoroso incêndio impressionou extraordinariamente a população. Porque não haviam de se juntar os homens da terra e organizar uma associação de bombeiros, como já havia em muitos outros concelhos? A ideia começou a tomar forma no verão de 1933 e é em pleno ambiente das festas em honra de Nª Senhora da Veiga, Padroeira do Concelho, que se dão passos decisivos nesse sentido. No mês de Novembro havia já inscrições para o primeiro Corpo Activo. Em 14 de Janeiro de 1934, fardados com uma simples farda de ganga, aparece uma vintena de homens, em frente aos Paços do Concelho, tendo sido recebidos pela Comissão Administrativa da Câmara e realizado um exercício de simulacro para extinção de incêndios. O facto foi notícia no jornal local “Notícias de Foz Côa”.Percorridos passos importantes, em 22-06-1934 é oficializada a Associação Humanitária. Foi seu primeiro presidente o sr. José Augusto Pinto e o primeiro comandante o sr. Júlio António Lopes. Os primeiros estatutos foram aprovados em 1-02-1936, que deram entrada no Governo Civil da Guarda em 15-02-1936. 
A GUARDA – Quantos elementos integram o Corpo de Bombeiros?
António Lourenço – Em Janeiro de 1935 havia 19 bombeiros. Veio depois o tempo da 2ª grande guerra e a Associação passou por tempos conturbados e difíceis. Retomada a vida normal e o entusiasmo, na década de 60, com a emigração para a França, voltou a verificar-se uma diminuição de voluntários. Na década de 70, com a construção do 1º Quartel, a par do regresso dos retornados de Angola e Moçambique, verificaram-se novas inscrições de voluntários. Os tempos vão evoluindo e muitos jovens, com as suas justas ambições pessoais e profissionais, vão abandonando Foz Côa e fixam-se em outras regiões do país ou rumam ao estrangeiro, verificando-se uma falta de jovens dispostos e disponíveis para ingressarem nas fileiras do voluntariado nos Bombeiros. Actualmente, há cerca de 40 elementos que integram o Corpo de Bombeiros, verificando-se disponibilidades diversas, dado que alguns estudam ou trabalham fora do concelho. 
A GUARDA – Quais as principais dificuldades com que se debate esta Associação?
António Lourenço – As exigências para qualquer Associação Humanitária aumentaram e são diversas. A população passou a esperar muito mais dos seus bombeiros, criando-se uma falsa ideia de que os poderes públicos, Estado e Câmara Municipal, apoiam suficientemente a sua Associação Humanitária, tornando-se dispensável o apoio pessoal e financeiro, para custear os diversos encargos, nomeadamente com o transporte de doentes para as diversas unidades de saúde. A burocracia tem aumentado, o que exige dos seus responsáveis, que exercem gratuitamente os cargos, a dedicar muito mais tempo à vida da Associação. Para dar a melhor resposta, perante as diversas ocorrências e não só na época dos fogos, é necessário haver veículos e equipamentos apropriados e em boas condições, o que representa um investimento elevado, não existindo por parte das entidades públicas o apoio e comparticipação necessários. Os meios físicos são necessários, mas também são indispensáveis os meios humanos. Havendo uma menor inscrição e manutenção de voluntários, cria dificuldades. Este tempo de pandemia Covid-19 também veio complicar, porque praticamente paralisou toda a formação e a formação inicial e contínua nos bombeiros é necessária e essencial.  A GUARDA – Quais os grandes desafios que tem pela frente? 
António Lourenço – Os desafios que há a enfrentar não são pessoais, mas sim colectivos, dos órgãos sociais, do corpo de bombeiros, das entidades públicas do sector e da população. Em conjunto podemos e devemos continuar a proporcionar as melhores condições de protecção e de socorro a toda a população, cada vez mais envelhecida. Está a difundir-se a ideia de que o trabalho nos bombeiros, a favor da comunidade, deve ser profissional e remunerado, custeado por diversos organismos, dado que os portugueses pagam impostos e têm direito à sua segurança, à sua protecção e ao socorro. As Associações Humanitárias, para cumprirem as suas missões, continuam a necessitar dos apoios da população e da colaboração de voluntários. Torna-se necessário que os jovens ganhem o sentimento e o gosto de participarem em tarefas comunitárias, nomeadamente inscrevendo-se nos bombeiros, para frequentar a necessária e devida formação e depois oferecerem o seu tempo, a sua disponibilidade e o seu trabalho, em favor de causas nobres e comuns.  Não só na época dos fogos rurais, integrados em equipas de combate a incêndios (ECIN) – pelas quais já recebem uma remuneração, mas também ao longo do ano, nas mais diversas missões. É preciso dignificar a actividade dos nossos bombeiros, assim como o Governo Central e as Câmaras Municipais, devem apoiar, como merecem e necessitam, as suas Associações Humanitárias. 
A GUARDA – Como é que os Bombeiros Voluntários de Foz Côa estão a preparar a época de incêndios?
António Lourenço – A época de incêndios, rurais ou urbanos, não se resume só aos meses de verão. Os bombeiros estão preparados para, em qualquer altura do ano, poderem actuar e resolver as ocorrências que aparecem. Para o período em que ocorrem mais incêndios rurais, temos os meios, veículos e equipamentos, em condições de poderem ser utilizados. Gostaríamos de ter mais meios humanos, para, quando fosse necessário, estarem disponíveis para ajudar no combate a esses mesmos incêndios. No entanto, porque os bombeiros não atuam isolados, mas sim, num espírito de grupo e de equipa, nas diversas ocorrências de incêndios, colaboram as Corporações de Bombeiros vizinhas da ocorrência, a solicitação e coordenação do Comando Operacional Distrital da Guarda. Existe uma entreajuda e colaboração entre as diversas Associações Humanitárias. A GUARDA  - É importante a formação contínua dos Bombeiros?
António Lourenço – A formação contínua é necessária e fundamental, nas diversas missões e nomeadamente em todas as questões relacionadas com os fogos rurais. 
A GUARDA – Como é que a Associação lidou e está a lidar com a situação de pandemia provocada pela Covid-19?
António Lourenço – A situação em Foz Côa foi complexa nos primeiros tempos da pandemia, com a existência de um grande surto. Com dedicação e espírito de sacrifício, conseguiu-se dar a melhor resposta possível. Na operação de testagem, bem como na vacinação, em todo o concelho, os nossos bombeiros colaboraram e deram o apoio que foi sendo solicitado pelas pessoas e pelas entidades envolvidas.